sexta-feira, 15 de julho de 2011

MEIO AMBIENTE EM FOCO - ENTREVISTA


Pesquisadora comenta Plano Nacional de Resíduos Sólidos

ENSP, publicada em 15/07/2011
Tatiane Vargas

Realizar um diagnóstico da situação atual dos resíduos sólidos no país, além de apresentar metas de redução de resíduos e de eliminação e recuperação de lixões, são alguns dos objetivos do Plano Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), que será apresentado até o fim de 2012 à sociedade. A implantação do PNRS - que define metas, diretrizes e mecanismos para o manejo adequado de resíduos em todo o Brasil por empresas públicas e privadas - é de responsabilidade do Comitê Interministerial de Resíduos Sólidos, representado por dez Ministérios, pela Casa Civil da Presidência e pela Secretaria de Relações Institucionais. O comitê é coordenado pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA).

O novo Plano orientará os planos estaduais e municipais para o manejo do lixo. A expectativa é de que seja atualizado a cada quatro anos, com vigência por tempo indeterminado. Também dará suporte ao decreto 7.404, que regulamentou a Política Nacional de Resíduos Sólidos, Lei 12.305/2010.

Saiba mais sobre o novo plano e o que muda com a sua implantação em entrevista concedida pela pesquisadora do Departamento de Saneamento e Saúde Ambiental da ENSP, Débora Cynamon Kligerman, ao Informe ENSP.

Informe ENSP: O que o novo Plano Nacional de Resíduos Sólidos pretende propor?

Débora Cynamon Kligerman:
 O Plano Nacional de Resíduos Sólidos tem como conteúdo mínimo o diagnóstico da situação atual dos resíduos sólidos no país, metas de eliminação dos lixões associadas a plano de inclusão social dos catadores, proposição de cenários e análises das tendências internacionais e macroeconômicas, metas de redução, reciclagem, reutilização e outras que reduzam a quantidade de rejeitos, metas para aproveitamento energético de gases gerados nas unidades de disposição final e programas, além de projetos e ações para o atendimento dos objetivos propostos.


Informe ENSP: Qual é o maior problema do país em relação aos resíduos sólidos?

Débora Cynamon Kligerman:
 O maior problema são os lixões, ou seja, a disposição inadequada destes resíduos. Porém, existem metas para acabar com este tipo de disposição inadequada. Essas metas preveem a redução do volume de lixo, pois grande parte das cidades não quer ter por perto nenhum local de disposição de resíduos, mesmo que seja um aterro sanitário. A ideia central é a redução. Para isto, a principal proposta é a implementação do instrumento chamado logística reversa, onde cada fabricante deve receber de volta seu resíduo e tratar. Ou seja, o fabricante de pneu deve receber pneu de volta e ver a melhor utilização. O que ocorre é que os materiais cada vez mais são mais complexos. Há também mistura de materiais o que dificulta mais ainda sua reciclagem. É preciso pensar também nos produtores de produtos tóxicos que devem pesquisar o tratamento adequado para os resíduos produzidos por eles.

Hoje, no Brasil, há um enorme passivo ambiental nas empresas, ou seja, empresas têm em seus pátios produtos tóxicos armazenados que deveriam ter um tratamento adequado. Isto é uma bomba relógio. Há necessidade, então, de empresas, universidades e governo atuarem em conjunto para pesquisar soluções viáveis. Ainda em relação à redução, enquanto o Brasil está tentando eliminar seus lixões, outros países, como os da Europa e o Japão, por exemplo, estão utilizando o lixo como fonte energética. Mas também existem problemas: é necessário saber, por exemplo, a composição do lixo para prever o quanto de energia será gerada. No Brasil, ainda há muitos municípios que não tem onde dispor seu lixo. Existem propostas de consórcios intermunicipais para a destinação de lixo. O que favoreceria também a questão de volume necessário para a geração de energia.

Informe ENSP: O que o plano pretende propor para mudar o panorama atual?

Débora Cynamon Kligerman:
 O novo PNRS deve obrigar cada município a ter seu próprio plano de gestão de resíduos sólidos. Infelizmente, nem todo município tem um técnico que cuide dos resíduos sólidos, por isso, a política não é tão fácil assim de ser implementada. Existe uma intenção do governo para aprovar essa política, que exige interesse de diversas cadeias, principalmente a produtiva. Ao lançar a logística reversa, o governo está fazendo com que ao mesmo que tempo que um produtor fabrica determinado produto ele consiga reintroduzi-lo no ciclo produtivo. O que também pode ser outro ponto para discussão, pois alguns produtos não conseguem facilmente ser reintroduzidos, pois não há equipamentos suficientes para reverter determinada matéria, por exemplo.

Informe ENSP: Como a logística reversa pode contribuir para a dispensação de resíduos sólidos no país?

Débora Cynamon Kligerman:
 A abordagem da logística reversa pressupõe que quando implementada haja um aumento de custo temporariamente para o produtor. Ao responsabilizar o fabricante por toda cadeia produtiva, a política pretende desenvolver estratégias para recuperação dos produtos, o que implica em custos não contabilizados anteriormente, ou seja, a tendência é que o produtor aumente o valor dos produtos. Isso tudo acontece porque nosso grande problema é não termos tratamento e destinação final para o lixo. Hoje a logística reversa está atacando em um ponto central, pois responsabilizando o fabricante a tendência é que ele produza um volume de lixo muito menor para os aterros sanitários e recebendo um volume menor de lixo os aterros podem durar mais anos, já que não há espaços disponíveis para dispor adequadamente o lixo, sendo assim, é fundamental reduzir a quantidade produzida e só se reduz quando se reaproveita, se recicla. Quando falamos de um plano de gestão, queremos apontar que é preciso pensar em toda cadeia, desde a produção a destinação final.

Informe ENSP: Como a ENSP vem trabalhando essa temática?

Débora Cynamon Kligerman:
 Atualmente, tenho trabalhado com resíduos especiais. Temos também pesquisas de alunos de mestrado e doutorado sobre resíduos de medicamentos, resíduos de entulho e a relação com a dengue e avaliação da Política Nacional. O Brasil é um país com um território enorme e por isso ainda pensamos em grandes espaços. Porém, nossa população é eminentemente urbana e nossos centros urbanos estão atingindo cada vez mais populações maiores. Dessa forma, as instituições de ensino e pesquisa precisam entrar no debate e pensar no que pode ser feito para reduzir a quantidade de lixo produzida. O plano é muito importante, mas aponta muito mais para a questão dos aterros sanitários. Enquanto isso, outros países já pensam em aproveitamento energético devido a falta de espaço. Pensar em estratégias que reduzam o volume de lixo depositado no ambiente é o principal papel das instituições de pesquisa como a ENSP. Assim, no futuro teremos um meio ambiente melhor, o que implica na saúde da população e consequentemente na qualidade e expectativa de vida. É fundamental entender que lixo também é uma questão de Saúde Pública.

Existe uma relação entre saúde e ambiente que precisa ser mais compreendida. É necessário que a Saúde Pública entenda a sua relação com o ambiente e tenha uma visão mais pró-ativa. Precisamos pensar que a promoção da saúde só virá com um ambiente saudável, com habitação descente, sistema de saneamento, ou seja, água de boa qualidade, rede e tratamento de esgoto, drenagem e coleta, tratamento e destinação adequada dos resíduos. Os nossos rios são poluídos com esgotos domésticos, mas também com lixo e esgoto de unidades de saúde. Há medicamentos sendo descartados na rede de esgotos. Isto traz impacto em todo o ecossistema, inclusive ao homem, então, é fundamental refletir para atuar junto a essas questões.

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